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Luciano Subirá a respeito de Esforço e Dedicação
Introdução
No capítulo 16 de seu livro Graça Transformadora, o pastor Subirá se baseia na frase do filósofo Dallas Willard: “A Graça não é o oposto do esforço, mas sim do mérito”. O intuito é afirmar que a Graça é um atributo divino que atua junto ao esforço humano, e só com esforço somos capazes de agradar a Deus.
Como já comentado aqui neste blog, esta frase de Dallas Willard é muito usada pra falar da relação entre Graça e diligência humana. Muitos que a usam, sequer conhecem o contexto em que ela é expressada pelo filósofo norte-americano, e é importante citar aqui.
Willard tinha pensamentos muito interessantes acerca do respeito por diferentes crenças, foi um filósofo que trouxe importantes questionamentos éticos a respeito de religiosidade e fé. Contudo, uma de suas crenças é problemática, pois consta justamente em pensar que “as pessoas podem se tornar ‘boas’ o suficiente para serem salvas sendo sinceras em suas tradições religiosas – não importa qual seja a fé.”1
Ou seja, na doutrina de salvação de Willard, pessoas podem ser salvas através de pura bondade e obediência. Ele afirma:
“… se alguém é digno de ser salvo, será salvo. Nesse ponto muitos cristãos ficam muito ansiosos, dizendo que absolutamente ninguém é digno de ser salvo. A implicação disso é que uma pessoa pode ser quase totalmente boa, mas perder a mensagem sobre Jesus e ser enviada para o inferno. Que tipo de Deus faria isso?”2
Para Willard, uma pessoa que é “quase totalmente boa” precisa ser salva. O filósofo tem uma clara concepção soteriológica de que as pessoas podem ser salvas pelas obras.
Ou seja, o pastor Subirá citou uma frase que possui uma perspectiva por parte de seu autor no mínimo discutível que, muito provavelmente, ele mesmo não concorda. Talvez tenha faltado pesquisar um pouco antes de basear seu argumento nesta frase.
O pastor faz a mesma coisa ao analisar o Evangelho da Graça sem pesquisar a fundo sobre o que os pregadores desta mensagem creem. Ao invés disso, ele simplifica certos tópicos e não se atenta a avaliar argumentações mais elaboradas por parte dos “gracistas”. É até difícil de elaborar uma análise sobre seu livro, pois ele não induz o leitor analisar os diferentes pontos de vista.
Neste trecho abaixo, vemos um exemplo claro da simplificação:
“Aos olhos de alguns, se enfatizarmos esforço, obras ou mesmo a importância das disciplinas espirituais, estaremos em choque com a graça divina. Esse equívoco, ou seja, anular as obras em nome da graça, é tão maléfico quanto acreditar no contrário: que as obras anulam a graça.” (pág. 256)
Esta afirmação é sensacionalista. Nenhum pregador da Graça anula as obras, muito pelo contrário, acreditamos que elas são frutos da nossa nova natureza. O único problema é quando elevamos as obras a uma condição carmática de buscarmos recompensas em troca de bons atos.
“Afirmam que o Eterno nos ama pelo que somos, não pelo que fazemos, e que nada do que fizermos de bom fará que o Altíssimo nos ame mais; por outro lado, nada que fizermos de ruim fará que ele nos ame menos. Até aí concordamos plenamente. O que não entendemos é por que essa verdade tem sido usada para depreciar a importância da dedicação do cristão. Por esse motivo, não podemos evitar concluir que se trata de uma dedução que revela a falta da macrovisão bíblica.” (pág. 262)
Mais um trecho onde Subirá exagera ao falar do ponto de vista dos pregadores da Graça. Nenhum de nós deprecia a importância da dedicação do cristão. O que acontece, e que ele parece ignorar, é que existem formas diferentes de enxergar o funcionamento desta dedicação. E é importante nos atentarmos a esses detalhes para entendermos o que ele pensa e o que nós pensamos sobre o assunto.
A visão de Luciano Subirá sobre Esforço
“Aos olhos de alguns, se enfatizarmos esforço… estaremos em choque com a Graça divina”.
Esta fala já sugere que o Luciano Subirá acredita que a vida cristã demanda um esforço para produzir algo. E outros trechos deste capítulo confirmam que é exatamente isso que ele pensa. Como já exposto no primeiro parágrafo deste texto, a visão do autor é de que o esforço humano é aliado direto da Graça divina.
“O propósito deste capítulo é enfatizar a importância da graça em nossas realizações, não negá-la. Contudo, antes de aprofundar este aspecto, é necessário esclarecer que, na interação entre a deidade e a humanidade, a ajuda divina não elimina a diligência humana.” (pág. 257)
“A dedicação na vida cristã não deve ser vista como concorrente da graça. Trata-se de uma expressão, dentro da visão da interação entre a ação da deidade e a da humanidade, do caráter interativo da graça. Isso foi definido e revelado, nas Escrituras, pelo próprio Deus.” (pág. 259)
“Jamais seríamos bem-sucedidos nos resultados ministeriais se estivéssemos confinados meramente ao esforço humano, sem a cooperação da graça. Em contrapartida, ressaltamos que Deus, sem a interação do homem, também não realizaria sua obra na terra. Se enfatizarmos apenas um dos aspectos, não alcançaremos a verdade nem teremos a visão completa, revelada na Palavra de Deus.” (pág. 261)
É perceptível que o Luciano Subirá acredita que esforço é o nosso empenho para ter boas obras, e que este empenho contribui com a Graça. É importante afirmar também que, segundo o pastor, este empenho não é uma busca para ser amado/aceito por Deus.
“Como afirmamos, o conceito de agradar a Deus não está relacionado com a busca humana por amor, aceitação ou valor. Pelo contrário, trata-se de uma declaração do valor que o nosso Criador e Redentor tem para conosco. O empenho, quando aplicado nesse contexto, é um reconhecimento do valor que o Altíssimo e seu Reino tem para nós; não se trata, como alegam alguns, da tentativa de alcançar valor ou mérito diante de Deus.” (pág. 265)
Entretanto, ele acredita que o nosso empenho é o que nos condiciona a sermos agradáveis a Deus.
É evidente que todos são igualmente amados por Deus. Ele deseja a salvação de todos (ITimóteo 2.4) e não faz acepção de pessoas (Atos 10.34; Romanos 2.11). Entretanto, nem todos agradam a Deus com seu modo de se comportar. Esse tópico é, sem dúvida, uma doutrina bíblica que não pode ser ignorada. Cristo, referindo-se ao Pai celestial, declarou: “faço o que lhe agrada” (João 8.29). Paulo também fez afirmações concernentes ao tema: “Por isso, temos o propósito de lhe agradar, quer estejamos no corpo, quer o deixemos” (2Coríntios 5.9). Notemos que o esforço do apóstolo não era para alcançar algum tipo de mérito; seu empenho tinha o único objetivo de agradar ao Eterno. As epístolas apresentam recorrentes ênfases sobre agradar a Deus. A repetição do tema eleva sua classificação de informação para algo enfático: Quanto ao mais, irmãos, já os instruímos acerca de como viver a fim de agradar a Deus e, de fato, assim vocês estão procedendo. Agora pedimos e exortamos a vocês no Senhor Jesus que cresçam nisso cada vez mais. Pois conhecem os mandamentos que demos a vocês pela autoridade do Senhor Jesus (ITessalonicenses 4.1,2).” (pág. 264)
Resumindo: o pastor Luciano Subirá crê que o esforço é um atributo humano que se alia a um atributo divino (a Graça) e com isso somos capazes de agradar a Deus. Assim, uma pessoa nascida de novo pode não ser agradável a Deus em certos momentos devido às suas atitudes. Por isso seria importante pregar também sobre esforço humano nas igrejas.
A visão dos pregadores da Graça sobre esforço
“Filho, o seu maior esforço é para descansar,
Não há mais preço algum a pagar
Tudo já está consumado,
Escrito de dívida cancelado e
Encravado na Cruz”.
Este é um trecho de um poema do cantor Séo Fernandes, um grande pregador da Graça. Séo traz neste verso a essência do que a Nova Aliança nos diz sobre esforço. Existe sim um esforço na vida cristã, e ele está diretamente relacionado ao descanso.
Portanto, esforcemo-nos por entrar nesse descanso, para que ninguém venha a cair, seguindo aquele exemplo de desobediência. (Hebreus 4:11)
É curioso porque o autor da carta aos Hebreus cita a entrada no descanso como sinônimo de obediência. Infelizmente, muitos irmãos ainda têm dificuldade de renunciar suas forças e descansar na força de Deus para serem transformados e enfrentarem os diversos problemas dessa vida.
Existem alguns pontos de concordância entre o que cremos e o que Subirá crê. Também cremos que nosso empenho não muda o Amor de Deus por nós e que servir faz parte da vida cristã. Porém, enxergamos a relação entre esforço e ser agradável a Deus numa perspectiva diferente.
Nós cremos que assim como Jesus foi chamado pelo Pai de “Filho amado, em quem tenho prazer” mesmo antes de fazer seu primeiro milagre (Mt 3:17), nós também somos chamados assim independente do que fazemos ou não. Isso só foi possível porque Jesus se identificou conosco nos substituindo na Cruz (2 Cor 5:21), logo, nossa nova identidade é pautada na identidade de Cristo. Somos santos, amados, agradáveis e plenamente redimidos (Ef 1:4-7). A única obra que nos torna agradáveis a Deus é a obra de Cristo. Por nós mesmos, não teríamos/temos esta capacidade.
Assim, não nos esforçamos para sermos agradáveis a Deus e nem para produzirmos boas obras. Cremos que essas coisas acontecem de forma natural, pois nossa nova natureza é destinada às boas obras, portanto, não teria nenhum sentido fazermos essas obras pensando em recompensas (Ef 2:8-10).
O que transforma o cristão não é se esforçar pra ser agradável, mas conhecer sua nova identidade. Quando entendemos e nos aprofundamos em quem Deus nos criou para sermos, naturalmente nossa mentalidade e nossas atitudes vão se aperfeiçoando ao que somos.
Não é como se esta visão fosse muito diferente. Inclusive, decidi concluir este texto com um trecho de uma música antiga e que traz esta revelação maravilhosa.
Não tenhas sobre ti
Um só cuidado qualquer que seja
Pois um, somente um
Seria muito para ti
É Meu
Somente Meu todo o trabalho
E o teu trabalho é descansar em Mim
Graça e Paz!
Notas de Rodapé
Que nossa morada seja o descanso e reconhecimento de si em Cristo Jesus. Excelente texto, irmão. Abraço!