Luciano Subirá vs Hiper Graça – Comentando o livro do Subirá

Introdução

Esse é o segundo texto da série de textos sobre o livro do Pr. Luciano Subirá, “Graça Transformadora”.1 No primeiro texto, analisamos o conceito de Graça apresentado por Subirá. Nesse segundo texto, pretendo tratar sobre as definições do Luciano Subirá de “Hiper Graça”. Os próximos textos serão escritos por outros autores VT, e trataram de outros pontos do livro.

As falácias de Luciano Subirá sobre a Hiper Graça

Em seu livro, Subirá não fornece muitas descrições sobre o ensino HG. Mesmo que ele descreva “indiretamente” sobre uma “moderna mensagem da graça” em grande parte do livro, não o vemos mencionando a Hiper Graça a não ser nas páginas finais do livro.

No tratamento sobre a Hiper Graça, Subirá intitula o capítulo como “O perigo dos extremos” (pág. 316). Muitos de vocês já conhecem essa história. No entendimento do Pr. Subirá, existem dois grandes extremos que devem ser evitados: legalismo e hiper graça. Segundo ele, a hiper graça pode ser descrita como “liberalismo” – aqui Luciano cria sua própria definição de liberalismo. De acordo com ele, a hiper graça é liberalismo porque fornece “permissão para pecar”:

Desde o início, condenamos tanto a tentativa de se transformar em libertinagem a graça de Deus (liberalismo)… (pág. 317)

Assim, os cristãos são chamados a evitar dois extremos perigosos. De um lado, existe o legalismo que subverte a graça de Deus, fornecendo uma justificação baseada nas obras, e do outro lado temos a hiper graça (liberalismo) que fornece licença para o pecado por meio da proclamação de uma graça conducente com a pecaminosidade. Ele ainda diz:

Há um movimento, nos dias atuais, que vem sendo rotulado de “hipergraça”. Particularmente, não gosto do termo. Sempre dizemos que a graça divina já é “mais do que hiper”. Por que dar a um movimento que, em sua grande maioria, distorce o ensino bíblico da graça um nome que deveria pertencer à propagação da graça pura e bíblica? (pág. 317)

O que Subirá sugere? Que evitemos esses dois extremos aceitando sua perspectiva de Graxa Transformadora (“Graça transformadora”). Neste caso, só existem 3 alternativas: 1) Legalismo; 2) Hiper Graça; 3) A posição de Subirá (uma posição “equilibrada”)

Para o Pr. Subirá não existe outra alternativa? Se defendemos a Hiper Graça então defendemos liberdade para o pecado? Apenas a visão de Subirá fornece uma verdadeira antítese ao pecado? Essas questões demonstram a ignorância de Subirá sobre o ensino HG.

Em primeiro lugar, as definições de Luciano Subirá sobre a Hiper Graça não podem ser sustentadas ou embasadas. Ele associa a Hiper Graça a uma espécie de liberalismo permissivo e conducente. O que obviamente exige provas de sua parte. Subirá tem o “ônus da prova”, ele precisa fornecer as evidências, colocar na mesa as referências que mostram que a hiper graça conduz a uma vida libertina. Do mesmo modo, Subirá tem o ônus de fornecer citações dos próprios escritos HG para fundamentar suas críticas. No entanto, ele falha miseravelmente nesse ponto, não fornecendo qualquer base ou fundamento. Ele simplesmente quer que seus leitores aceitem suas palavras no seco – os que agem por ignorância e preguiça aceitarão.

Se o ensino HG é tão perigoso e permissivo desta forma, não deveríamos esperar citações referentes de líderes e escritos? Não devemos citar diretamente esses “hereges”?

A falta de referências sobre o ensino HG por parte do Luciano Subirá está associado à sua definição da Hiper Graça como “liberalismo”.

Em segundo lugar, por falta de conhecimento e entendimento a respeito do que realmente ensinamos, Subirá deturpa o ensino HG, e fornece críticas a sua própria deturpação. Isso é o que chamamos de “falácia do espantalho”.

Na área argumentativa, um argumento é baseado em premissas lógicas que levam a uma conclusão coerente. Quando as premissas são falsas e insustentáveis, chamamos de “falácias”. As falácias são falsos argumentos que possuem aparência de lógica. No caso da falácia do espantalho, o argumentador que a usa, cria sua própria definição do que está atacando ou contra argumentando. Ele simplesmente deturpa o argumento do seu “oponente”, seja acrescentando algo que não é dito, ou retirando pontos importantes. E assim, se cria um “espantalho” que pode ser facilmente atacado e refutado.

O Pr. Luciano Subirá comete tal falácia ao deturpar o ensino HG, afirmando que somos conducentes com o pecado, que somos liberais. Assim, logo depois, Subirá fornece vários versículos contra esse espantalho, atacando sua própria deturpação.

Em terceiro lugar, Subirá comete a falácia do falso dilema. Nessa falácia, existe apenas “duas” ou “três alternativas”. Exemplo: Ou você escolhe A ou você escolhe B. Em sua crítica ao ensino o HG, Subirá nos coloca ao lado do liberalismo permissivo, vis-a-vis com o legalismo religioso. Segundo ele, se defendemos a Hiper Graça, então somos liberais. Não existe uma outra alternativa? Não é possível realmente defender o ensino HG e não ser liberal? A falácia do falso dilema dicotomiza o debate entorno de duas ou três alternativas. Porém, isso é claramente falso. O ensino HG não é o que Subirá descreve. A falta de base e fundamento de sua parte demonstra sua ignorância sobre os nossos ensinos, o que produz falácias argumentativas.

Judas 4

Após construir às suas falácias, Subirá cita o famoso texto de Judas 4:

Pois certos homens, cuja condenação já estava sentenciada há muito tempo, infiltraram-se dissimuladamente no meio de vocês. Estes são ímpios, e transformam a graça de nosso Deus em libertinagem e negam Jesus Cristo, nosso único Soberano e Senhor. (Judas 1:4)

Comentando sobre o texto, ele escreve:

O problema, apresentado nessa advertência, é que a graça estava sendo transformada em libertinagem! Falsos mestres tentaram, desde o início da fé cristã, transformar a graça divina em algo que ela não é, nunca foi e nunca será: libertinagem. (pág. 318)

Perceba o pressuposto básico do Pr. Subirá: Os professores da Hiper Graça defendem a libertinagem, logo, esse texto se refere a eles. Para refutar tal pressuposto, basta realizarmos ao menos uma pergunta que põe abaixo toda a argumentação de Subirá: Onde estão as evidencias de que o ensino HG fornece liberdade ao pecado?

Do mesmo modo, uma exegese sincera do texto já demonstra o objetivo do autor de Judas nesse verso. Ele destaca que esses hereges transformavam a graça em libertinagem ao “negar Jesus Cristo, nosso único Soberano e Senhor”. Uma pergunta: Os professores HG negam a Jesus? De nenhuma forma! Os professores HG são os mais centrados em Cristo!

Outro detalhe do texto, comentando por pastores como Joseph Prince, diz respeito a palavra “transformam”. O que Judas tem em mente ao dizer que esses hereges transformavam a graça em libertinagem? A palavra grega aqui é “metatithemi” (μετατίθημι) que Strong define como “transferir, mudar”. A concordância exaustiva define como “transferir, ou seja (literalmente) transportar, (por implicação) trocar, (reflexivamente) mudar de lado, ou (figurativamente) perverter — transportar, mudar, remover.”2

Em outras palavras, a “transformação” da graça é definitivamente uma troca. Para que haja perversão da graça de Deus em libertinagem é necessário troca-lá por outra coisa. A Graça em si, jamais induziria ao pecado – não enquanto o crente tem consciência dela.

Existem outros versos que utilizam “metatithemi” que podem nos auxiliar na compreensão:

“E foram transportados (metatithemi) para Siquém” (Atos 7:16) – Isto é, eles foram “tirados” de um lugar a outro.

Admiro-me de que vocês estejam abandonando (metatithemi) tão rapidamente aquele que os chamou pela graça de Cristo, para seguirem outro evangelho. (Gálatas 1:6) – Os gálatas estavam trocando a Graça pela Lei!

Pois quando há mudança (metatithemi) de sacerdócio, é necessário que haja mudança de lei. (Hebreus 7:12) – o sacerdócio foi “trocado”, houve uma mudança de sacerdócio para outro.

O termo (metatithemi) é utilizado para se referir a essa mudança de algo para outro. Não é uma transformação no objeto em si, mas do objeto para outro. A transformação da graça não é uma transformação interna, como se ao recebermos a Graça, decidíssemos pecar. Na verdade, a transformação acontece na troca da graça por algo que fornece verdadeira licença ao pecado. Uma outra evidencia disso é o final do verso 4 de Judas:

Estes são ímpios, e transformam a graça de nosso Deus em libertinagem e negam Jesus Cristo, nosso único Soberano e Senhor. (Judas 1:4)

Esses hereges “transformavam” (trocavam) a graça ao rejeitar Jesus Cristo, ao negá-lo. A negação de Jesus está ligada a transformação da Graça. É impossível negar Jesus e ainda permanecer na Graça. Justamente porque a Graça é Jesus. Deste modo, esses homens negavam Jesus, e transformavam a Graça em libertinagem ao trocá-la por outra coisa.

No que consistia essa negação e rejeição da graça e de Cristo? Em incredulidade. No verso 5, o autor cita um exemplo ligado ao verso 4:

Embora vocês já tenham conhecimento de tudo isso, quero lembrar-lhes que o Senhor libertou um povo do Egito mas, posteriormente, destruiu os que não creram. (Judas 1:5)

A incredulidade trouxe destruição a Israel. Do mesmo modo, a incredulidade em Jesus traz destruição ao homem. Rejeitar a Jesus é não crer em sua obra suficiente. Os hereges de Judas 4 negavam Jesus e a sua obra, afirmando que poderiam pecar livremente, que não haveria consequências para o pecado. Nenhum proponente HG se aproxima da descrição de Judas. Todos, com unanimidade, defendem que existem consequências para o pecado.

O que os professores HG tem a dizer sobre esse verso? O Dr. Paul Ellis comenta:

Pregue o evangelho da graça e alguns perguntarão: “Se a graça de Deus é maior que meu pecado, por que não posso continuar pecando?”. Essa foi a questão que Judas está enfrentando aqui. A graça de Deus nos ensina a dizer não à impiedade, mas a licença nos ensina a dizer sim.

Jesus morreu para nos libertar, mas podemos perder nossa liberdade de duas maneiras; por legalismo ou licenciosidade. A primeira coloca etiquetas de preço na graça gratuita de Deus, enquanto a segunda remove as etiquetas de preço do pecado. A licenciosidade diz para fazer o que quiser, pois estamos debaixo da graça e não da lei. É uma verdade parcial que leva ao cativeiro e à morte.3

Joseph Prince comenta o seguinte sobre as consequências do pecado:

O pecado é destrutivo. O pecado separa casamentos, famílias e entes queridos… Então deixe-me deixar isso absolutamente claro: o pecado é horrível! O pecado vem com consequências danosas. Sou contra o pecado e é por isso que prego a graça de Deus! Sua graça é a única resposta para vencer o pecado!

Da mesma forma, se alguém está deliberadamente se envolvendo no pecado e vivendo um estilo de vida pecaminoso, ele será queimado pelas consequências destrutivas que vêm com o pecado.4

Prince comenta de forma correta a existência de consequências para o pecado. Esse ponto é defendido por todos os pastores e líderes HG. Todos nós incentivamos uma vida de piedade. A diferença substancial do nosso ensino para o Pr. Subirá é na questão do “como” isso deve acontecer. Nós divergimos na questão do processo. Enquanto Subirá acredita no processo como uma cooperação entre o esforço humano e a graça de Deus, os professores HG defendem que uma vida piedosa é o produto de uma consciência mais abrangente e profunda do Evangelho. O ensino HG defende o esforço para o descanso (e não esforço e descanso).

No próprio livro de Judas, o autor destaca como podemos viver longe da libertinagem dos hereges do verso 4:

Mantenham-se no amor de Deus, enquanto esperam que a misericórdia de nosso Senhor Jesus Cristo os leve para a vida eterna. (Judas 1:21)

Observe que a chave para vencer a licenciosidade não é manter uma lista de regras, mas mantendo-se no “amor de Deus”. A Graça e o amor de Deus são o que motivam uma vida transformada.

Legalismo e Hiper Graça na interpretação do Luciano Subirá

Em suas deturpações do ensino HG, Subirá prossegue:

Infelizmente, a graça tem se transformado, no ensino de muitos, em “permissão para pecar”. Quer por meio de afirmações diretas quer por meio de afirmações indiretas (com pressuposições e conclusões a que esse ensino remete), essa triste deturpação da graça divina tem causado estrago na vida espiritual de muitos. (pág. 319)

Subirá afirma que a hiper graça fornece “licença para pecar” por meio de afirmações diretas ou indiretas. O que seria uma afirmação direta? Seria “Você pode pecar o quanto quiser!”, “Vá e peque”? Os pregadores HG fazem essas afirmações? Se sim, o Pr. Subirá poderia nos fornecer as citações, as evidências disso? Da mesma forma, o que seriam “afirmações indiretas”? Subirá poderia ser direto a esse respeito? Afirmações indiretas seriam “pressuposições” a respeito da eficácia e suficiência da Obra de Cristo? Seriam afirmações em relação ao perdão completo de Deus? Desde quando essas são afirmações “indiretas” sobre uma suposta licença para o pecado? Se essa é conclusão do Pr. Subirá, ela é extremamente forçada.

Por último, Subirá faz uma longa citação de John Wesley, e conclui:

É impressionante quão atuais as palavras de Wesley, proferidas no século XVIII, soam hoje; ele se referiu ao excesso do legalismo que se tornou em desculpa para o liberalismo: “Correndo para extremo tão palpavelmente contrário à Escritura, eles dão lugar a que outros corram para o lado oposto”. Como Leonard Ravenhill disse certa vez: “Quando existe alguma coisa na Bíblia de que as igrejas não gostam, elas chamam isso de legalismo” (pág. 320)

Novamente, Luciano Subirá associa de forma equivocada o ensino da Hiper Graça com o “extremo do liberalismo”. Ao contrário do que Subirá apresenta, os defensores HG saíram das garras do legalismo e encontraram descanso na suficiência de Cristo, onde suas vidas são diariamente transformadas a semelhança de Cristo. Eles não correram para o extremo da libertinagem, e nem ao mesmo para as misturas que Subirá faz.

Me permita discordar da citação do Subirá de Ravenhill: Nenhum pastor HG olha para certos textos da Escritura e diz “isso é legalismo!” Nós olhamos para as Escrituras com uma lente cristocêntrica e pactual, onde compreendemos a diferença entre Lei e Graça. Desta forma, nós olhamos certas partes da Escritura e afirmamos, “isso é a Lei!” A Lei não é legalismo, a Lei destrói o legalismo, pois o legalismo diz que o homem pode adquirir salvação e identidade por meio do esforço. A Lei estraçalha tal orgulho. Nós vemos a Lei, com toda a sua exigência e peso, e recorremos a Cristo como nossa suficiência!

Conclusão

Em linhas gerais, o tratamento do Pr. Luciano Subirá sobre a Hiper Graça é visivelmente fraco, pelos seguintes motivos: 1) Ele não fornece quaisquer provas e evidencias dos nossos escritos; 2) Ele não cita pregadores e escritores HG para fundamentar suas críticas; 3) Por causa dos pontos anteriores, Subirá constrói sua argumentação em cima de falácias, e comete o equívoco de ligar o ensino HG a libertinagem.

Eliezer Oliveira
Eliezer Oliveira

Tenho 25 anos e sou diretor do Blog Vida Trocada, autor dos livros E Ele nos tornou Santos, Nada Além do Sangue (Livro Publicado) e Hiper Graça: O Que Realmente Defendemos (Livro Publicado). Também sou coautor do livro Interpretando a Escritura. Sou professor do curso Universidade da Graça, Vida na Graça e Teologia com Graça, e também atuo como Escritor Fantasma para alguns ministérios. Atualmente estou cursando Teologia (ESTÁCIO), sou casado com uma escritora maravilhosa, amante da leitura e de um bom café.

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